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LEOBINO DE FREITAS BACELLAR,  vida longa e de sucesso (primeira parte).

Autoria de José Nilton Carvalho Pereira*
Registro de Identidade de Antonio de Freitas Bacelar, primeiro filho de Leobino.
Arnaldina de Freitas Bacelar, mãe de Leobino.
Obituário de Germinia de Freitas Bacelar, primeira esposa de Leobino, falecida em 1918 em Araci. Fonte: Jornal O Serrinhense
Obituário de Maria Carolina, segunda esposa de Leobino, falecida em 1927, na cidade de Araci. Fonte Jornal O Serrinhense

A história de vida de Leobino de Freitas Bacellar coincide com o crescimento da cidade de    Serrinha-BA. Leobino nasceu em Irará (antiga Purificação dos Campos), em 20/12/1877 e faleceu em Serrinha, em 7/12/1957. irará é um nome tupi, que signifia “mel”, “muito mel”. Serrinha assumiu a liderança da região após a chegada  dos trilhos e do trem de ferro (1880), com percurso final que ligaria Salvador a Juazeiro. Na crônica histórica da época dizia-se, em Salvador, que finalmente o mar iria encontrar o rio e conhecer o sertão.

Leobino deve ter chegado a Serrinha, certamente entusiasmado com a fumaça e o barulho do trem, e com o progresso trazido pelas ferrovias.  Em Serrinha conheceu aquela que seria a primeira de suas três esposas (Germina Álvares de Freitas), de pai sergipano e mãe baiana, futura Germina de Freitas Bacellar (enterrada no primeiro cemitério de Araci, ao pé da Ladeira do Bonfim, construído pelo fundador da Vila, José Ferreira de Carvalho, que foi bem sucedido na  profissão de contratador e cobrador de dízimo da igreja católica.

Antes do trem em Serrinha, a estrada real para Salvador percorria pelo povoado da Manga (atual Biritinga).  Essa estrada vinha da imperial vila de Tucano (na origem, “tocanos”, em conformidade com  depoimentos do frei Apolônio de Todi (ver data), missionário andarilho, que teve a glória de reformar a igreja de Tucano e construir as 21 capelinhas de Monte Santo (Serra do Piquaraçá). Essa estrada bifurcava-se em Araci (então vila do Raso. A imperial Vila de Tucano já cantava progresso e sucesso desde 1843, ainda no início do Segundo Reinado.

Para entender por que Leobino, comerciante de sucesso, morou mais de 25 anos em Araci, é necessário, pelo menos, um esclarecimento. Araci era uma encruzilhada. Mundos distintos cruzavam-se em Araci, graças a uma grande aguada natural (Lameirão do Raso, posteriormente, Tanque da Nação, hoje uma praça).

Ao Oeste, passava em Araci o caminho rústico e primeira estrada até Monte Santo, viajando-se ao poente, pelo distrito de Pedra Alta; ao Leste (nascente), a estrada colonial do morgadio de Guedes de Brito (da colonial Casa da Ponte), que começou a ser construída em 1609 e percorria até Jacobina, conforme depoimento do próprio Antônio Guedes de Brito, na cidade da Bahia (Salvador) ao desembargador português Sebastião Cardoso Sampaio, em 1676. (A fonte básica é o depoimento original do próprio Guedes de Brito (Ver a introdução do livro Araci, 200 anos (2012), de José de Oliveira Mota – Abelardo – tetraneto do fundador.)  Essa estrada saía da Baixinha dos Padres, perto da Natuba (Nova Soure) , passava no Lameirão do Raso (Araci) e prosseguia a certa distância. mas nas proximidades do rio Itapicuru-mirim até Jacobina.  Foi a primeira estrada que ligou a poeira do sertão à lama do massapê. Finalmente, ao Norte, a estrada que vinha de Tucano. Atravessava-se de canoa ou balsa o rio Itapicuru-açu, no local do, hoje,  crescente povoado do Jorrinho.

Por que toda essa descrição?  Tudo porque esse múltiplo entroncamento deve ter influenciado o futuro major da Guarda Nacional, Leobino de Freitas Bacellar, a abandonar a telúrica Irará e  prazerosa Serrinha – grande beneficiária da estrada do trem  de ferro -, e a fixar moradia no começo do século XX, na Vila do Raso..

Nessa época, a Vila do Raso era passagem de garimpeiros vindos da Natuba (Nova Soure) e outras regiões, todos para faiscar esperança, em busca de ouro, no Itapicuru, Rio da Prata e Rio do Peixe. Algumas pensões acolhiam esses garimpeiros, como a de João Donato Pinheiro, pai da  ex-vice diretora do Ginásio Municipal Oliveira Brito (atual CEMOB), a professora Júlia Oliveira Pinheiro (ainda viva e com saúde). Ficava ao lado sul da praça, quase em frente ao jardim.

 Houve muito movimento naquela vila pacata. Construiu-se o Paço Municipal (prefeitura), e o comércio cresceu até o início dos anos vinte, também por motivo da grande produção de “caroá’, planta nativa e abundante na região. A produção era escoada, principalmente, pela estrada de ferro (estação de Salgadália). Na trilha do caroá muitas redes balançaram, muitas bolsas e sacolas artesanais foram desenhadas e artesanalmente fabricadas. Nas cordas dos navios, o caroá percorreu vários continentes.

Acrescente-se que, na vila sertaneja, já moravam duas irmãs casadas de Leobino. a mais velha, América Freitas Bacellar, casada com José Pedro de Carvalho, bisneto do fundador de Araci. Em 1812, o serrinhense José Ferreira de Carvalho, contratador da igreja e cobrador de dízimo, com família de origem de Santiago do Iguape (perto de Cachoeira). a família Santiago de Serrinha é descendente do iguape. A família Carvalho, por sua vez, provém de um padre que batizou José Ferreira em Santana do Catu (atual Catu). Dos 9 irmãos de José Ferreira, somente ele e o irmão Antônio Alves mantiveram o sobrenome Carvalho. O pai de José Ferreira era Manoel Ferreira Santiago (Santiago do Iguape) e a mãe, Maria da Conceição

A irmã mais nova, Isaura Bacellar de Carvalho), casada com um irmão mais novo  de José Pedro de Carvalho, último intendente de Araci (1931).Ttibúrcio Valeriano de Carvalho casou com Isaura Freitas Bacellar em 1902, tendo como testemunhas os senhores José  Pinheiro e João Donato Pinheiro, filhos de Joaquim Pinheiro de Oliveira – araciense tradicional -, que facilitara, anos antes, o casamento de América, filha de Felisberto Bacellar, grande comerciante de carne e cereais em Irará, com um desconhecido do Sertão de Cima.

Leobino se mudou para Araci já no início do século XX. Seu segundo filho, Jambinho (João Álvares Bacellar) nasceu em Araci (4/9/1905). Os outros filhos do primeiro casamento nasceram lá. Apenas o mais velho (Antônio Bacellar) nasceu em Irará (1900). O comércio de Leobino,  variedades e negócio de cereais e fumo,  ocupava um quarteirão da principal praça da vila:  Praça da Conceição, com  esquina ao Norte com a atual Rua Antônio Oliveira Mota (à época, Beco do Tucano). A frente, na esquina da praça, era o comércio (3 portas), com mais 4 portas à entrada do citado Beco do Tucano. Seguia-se uma grande chácara de residência até a próxima esquina (depoimento de minha mãe, Carmem, que brincava na casa da tia Carolina, segunda esposa de Leobino).  Essas chácaras residenciais eram comum à época. A maior era a do coronel José Roque de Oliveira, no mesmo lugar onde havia morado antes o fundador (José Ferreira de Carvalho, e hoje uma parte é o Mercado Municipal.

Vale relembrar que o  grande comércio de Leobino ficava na frente, esquina entre a praça e a rua. Eu, autor deste texto, ainda alcancei esse armazém, com quatro portas do lado da rua e mais três abraçando a praça, perto da igreja velha. A estrada de Serrinha a Tucano (estrada real) passava na frente do comércio de Leobino.

Nos últimos anos da década 1910,  Leobino comprou no outro lado da praça (lado Sul), a esquina  com a Rua Barão de Jeremoabo e ali estabeleceu o filho mais velho, o único nascido em Irará:  Antônio de Freitas Bacellar.. Antes, estava ali o  comércio de seu cunhado, marido de Isaura, o meu avô Tibúrcio Valeriano de Carvalho. Posteriormente tornou-se a venda de João Pinho (pai de Sidel e Raimundo, entre outros). Ali, o ex-sanfoneiro João Pinho construiu um dos primeiros sobrados de Araci. Hoje é uma pousada, mas com a  mesma estrutura de sobrado.

E assim ficou tudo certo. Leobino dominava o comércio de Araci, de ponta a ponta,  nas duas principais esquinas da praça: ao Norte e ao Sul, margeando a estrada real. Seus rivais de respeito eram apenas dois: o coronel  José Roque de Oliveira  (loja O Popular)  e a família Mota, do patriarca  e amigo Antõnio Oliveira Mota (loja Mota & Filhos), depois sucedido pelo filho Francisco Ferreira da Mota (Chico Laranjeira) e do neto João  Oliveira Mota, a quem muito conheci.

Quanto ao cunhado – Tibúrcio Valeriano de Carvalho só lhe restou desgosto, ao se mudar com a família para o povoado da Manga (hoje Biritinga). Arriscou o futuro na plantação e comércio de fumo, grande sucesso e ilusão na época. Conheceu a falência e retornou a Araci, onde foi amparado pelo irmão José Pedro, esposo de América Bacellar.  Veio a falecer em março de 1933.  A única lembrança positiva da Manga foi o nascimento de duas filhas: Helena Bacellar de Carvalho (Manga, 1917- Lamarão, 29/10/1994) e Carmem Bacellar de Carvalho (Manga, 29/12/1918 – Salvador, 22/11/2011).Helena é a mãe do padre José Abel Carvalho Pinheiro, ex- pároco de Irará e Feira de Santana. Hoje, pároco principal da Catedral basílica de Salvador, a mais antiga das Américas. Helena de Lamarão  também é a mãe dos fazendeiros  Vevé (falecido), Esmeraldo (Memel, falecido) , Toinho do Lamarão, Messias,  Petrônio e Nilton;  e de professoras : Maria do Carmo, Petinha, Zélia e Celeste. É avó, entre outros,  de serrinhenses de sucesso:  Antônio Inácio de Carvalho Pinheiro Filho, Sibele Medeiros Pinheiro e Cristiane Medeiros Pinheiro (filhos de  Antônio Inácio de Carvalho Pinheir;  Valtinho Pinheiro Nunes Neto, Patrícia e Naiane Freitas Pinheiro (filhos de Vevé: Everaldo Pinheiro. Carmem Bacelar de Carvalho, a mais longeva da família, viveu quase noventa e três anos. Era  a mãe do autor desta crônica de família.

* O professor José Nilton Carvalho Pereira nasceu em Araci-Bahia. É membro da Diretoria e benemérito do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia (IGHB); diretor e Membro Benemérito da Academia Baiana de Educação, desde 2002; Conselheiro Estadual de Educação durante 15 anos (1991-2006); membro fundador do Conselho Municipal de Educação (Lauro de Freitas-BA); sócio-mantenedor do Curso e Colégio Nobel (1973-1985),o maior colégio que já existiu na Bahia com, aproximadamente, 10.000 alunos – portanto diretor de Escola há mais de 40 anos; fundador e sócio-mantenedor do Colégio Apoio; professor de Língua Portuguesa, Literatura Brasileira e Redação, desde 1971.

Linha genealógica:

Registro de batismo de Leobino de Freitas Bacelar em 1878, na Matriz de Irará
Patente de Major Fiscal de Leobino

Fonte: https://pt.geneanet.org/